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Um estudo sociocognitivo dos antropônimos “Enheduana” e “Akhenaton”: a autonomeação como comunicação político-performativa
A sociocognitive study of the antrhoponyms ‘Enheduanna’ and ‘Akhenaton’: self-naming as political-performative communication
Um estudo sociocognitivo dos antropônimos “Enheduana” e “Akhenaton”: a autonomeação como comunicação político-performativa
Classica - Revista Brasileira de Estudos Clássicos, vol. 36, pp. 1-23, 2023
Sociedade Brasileira de Estudos Clássicos
Recepción: 15 Agosto 2022
Aprobación: 27 Febrero 2023
Abstract: This visitation to the onoma (proper name) from the Sociocognitive Anthroponomastics articulates the performative value of the diachronic phenomenon of self-naming to identity mechanisms of power maintenance common to the political making of the Ancient Age, especially the Akkadian Empire (Ancient Mesopotamia) and the 18th Egyptian dynasty (New Empire of Egypt). In order to understand the anthroponyms (proper names of a person) arising from self-naming (secondary naming that an individual assumes for himself) as statements of illocutionary force that communicate political desires through religious cosmovisional belonging, this discussion will be guided by the contextualization of two self-nominations brought to the historical agenda by Archeology: ‘Enheduanna’ (En, ‘high/high priestess’; hedu, ‘ornament’; Ana, ‘from heaven/paradise’), high priestess of the Sumerian temple of the moon god ‘Nana’ in Ur – whose primary Akkadian name makes if unknown – and ‘Akhenaton’ (‘effective spirit of Aten’), Egyptian monarch of present-day Amarna (formerly Akhetaten) whose public name, before the Amarna religious reform, was Amenhotep IV (‘Peace of Amun’). The literature review necessary for the elaboration of this qualitative research is guided by the interdisciplinary and draws the recursive sociological relationship between the autonominative phenomenon and sociocognitive communication of political-religious belonging through the metonymic semantics of the secondary anthroponym.
Keywords: Sociocognitive Anthroponomastics, Self-naming, Sociocognition, anthroponym, Enheduana, Akhenaton.
Resumo: Esta visitação ao onoma (nome próprio) a partir da Antroponomástica Sociocognitiva articula o valor performativo do fenômeno diacrônico da autonomeação a mecanismos identitários de manutenção do poder comuns ao fazer político da Idade Antiga, especialmente do Império Acadiano (Antiga Mesopotâmia) e da XVIII dinastia egípcia (Império Novo do Egito). A fim de se perceber os antropônimos (nomes próprios de pessoa) oriundos da autonomeação (nomeação secundária que um indivíduo assume para si) enquanto enunciados de força ilocutória que comunicam desejos políticos mediante o pertencimento cosmovisional religioso, esta discussão se pauta na contextualização de duas autonomeações trazidas à pauta histórica pela Arqueologia: “Enheduana” (En, “alta/sumo sacerdotisa”; hedu, “ornamento”; Ana, “do céu/do paraíso”), sumo sacerdotisa do templo sumério do deus da lua “Nana” em Ur – cujo nome primário acadiano faz-se desconhecido – e “Akhenaton” (“espírito eficaz de Aton”), monarca egípcio da atual Amarna (outrora Akhetaton), cujo nome público, antes da reforma religiosa de Amarna, era Amenhotep IV (“paz de Amon”). A pesquisa bibliográfica necessária à elaboração desta investigação qualitativa pauta-se pela ótica interdisciplinar e desenha a relação sociológica recursiva entre o fenômeno autonominativo e a comunicação sociocognitiva de pertencimento político-religioso pela semântica metonímica do antropônimo secundário.
Palavras-chave: Antroponomástica Sociocognitiva, Autonomeação, Sociocognição, Antropônimo, Enheduana, Akhenaton.
Preâmbulos acerca da antroponomástica sociocognitiva e da autonomeação
A Antroponomástica Sociocognitiva (Camargo, 2022, p. 61-101)1 é uma área recente das pesquisas antroponímicas, ou seja, uma vertente dos estudos onomásticos2 de ordem cognitiva (estudos da conceptualização do nome próprio) e sociológica (estudo social do nome próprio) que focaliza a descrição complexa (Morin, 2001, p. 25) linguístico-cognitiva, cultural, social e histórica – do nome próprio de pessoas (doravante antropônimo). As investigações em Antroponomástica Sociocognitiva têm seu marco temático a partir da publicação do artigo de Seide (2021, p. 81-6): “Proposta de definição interdisciplinar do nome próprio”.3 Na pesquisa, a autora corrobora a necessidade de ampliação social da perspectiva de estudo cognitivo dos nomes próprios, especialmente de investigações associadas à comunicação do antropônimo com respaldo na Teoria da Relevância – doravante TR (Wilson, Sperber, 2005, p. 221) – a qual, por considerar que “[....] expectativas de relevância são precisas e previsíveis o suficiente para guiar o ouvinte na direção do significado do falante [...]”, admite contemplar o nome próprio enquanto enunciado4 dotado de conceito.5
Assim, vislumbrando o nome próprio enquanto forma passível de interpretação inferencial, é possível afirmar que tal forma linguística circunscreva, necessariamente, um endereço conceitual constituído por componentes lexicais, gramaticais e enciclopédicos (Seide, 2021, p. 76-82).6 A partir dessa ótica, é necessário considerar, ainda, especialmente quanto ao último componente (enciclopédico), o contexto histórico da comunicação do antropônimo, os interpretantes e interesses envolvidos no paradigma comunicativo, bem como o grau de conhecimento de mundo socialmente partilhado acerca da referência (nomeado)7 ou da forma linguística (Conhecimento Onomástico do Falante – CO).8
A recente área dos estudos antroponímicos que se nomeia Antroponomástica Sociocognitiva (Camargo, 2022, p. 61-101) deve ser percebida enquanto ampliação sociológica, cultural e histórica dos estudos cognitivos do nome próprio de pessoas, relacionando-se com os estudos sociocognitivos (Salomão, 1999, p. 61-79; Tomasello, 2003, p. 5; Silva, 2017, p. 72-81) a partir dos quais a linguagem é “[...] o local onde, dialeticamente, a exterioridade (o cultural, o social e o histórico) se relaciona com os processos internos (nossos esquemas mentais), construindo [...] versões públicas do mundo” (Ferreira, 2009, p. 6).
As pesquisas comuns a tal viés teórico aplicadas ao estudo dos nomes próprios de pessoa podem, pois, pautar-se, metodologicamente, desde a pesquisa etnográfica9 até a aferição de antropônimos presentes em fontes primárias (registros/documentos/artefatos) e a revisão de estudos históricos, antropológicos, sociológicos e etnológicos ou interdisciplinares predecessores, desde que proponham análises complexas – que recuperem, ainda que parcialmente, o contexto histórico/comunicativo dos antropônimos, tratando, ainda, dos processos de sua conceptualização10 (Lakoff, Johnson, 1980, p. 60, 126, 269). Podem, por fim, estar associadas à descrição de fenômenos antroponímicos diacrônicos (relativos ao aspecto evolutivo dos antropônimos), sincrônicos (recorte de determinado momento do uso da língua), ou àqueles que focalizem um todo complementar/recursivo (Giddens, 1998, p. 110):11comparativo das partes dialéticas (diacronia/sincronia).12
Neste estudo, há ênfase na descrição sociocognitiva – portanto, na descrição da construção de sentido – de nomes secundários assumidos após batismo primário e advindos da autonomeação diacrônica: evento no qual o indivíduo, ao longo das sociedades antigas e clássicas, nomeava a si mesmo.13 Para descrever esse fenômeno que instaura uma reelaboração simbólica (Lacan, 1998, p. 498; 2005, p. 45; 2009, p. 207) de uma referência, ou seja, uma ressignificação pessoal do traço unário lacaniano,14 destacam-se os antropônimos secundários Enheduana (2285–2250 a.C.; Lentz, 2020, p. 13) e Akhenaton (1353 a.C.–1335 a.C.).15 O primeiro nome próprio está vinculado à referenciação da sumo-sacerdotisa do templo de Nana – com cultos majoritários à filha do deus Nana, Inana – e o segundo ao monarca egípcio do Novo Império, que viria a propor a reforma religiosa egípcia conhecida como Amarna: a negação do culto a Amon e ao politeísmo e a elaboração de uma religião monoteísta cujo deus seria Aton.16
É preciso considerar – enquanto perspectiva recursiva – que a autonomeação persiste das sociedades antigas (3500 a.C.) até as advindas pós-desagregação do Império Romano do Ocidente (476 d.C.), ou seja, comuns também à Idade Média (476 d.C.–1453) e à Idade Moderna (1453–1789). Especialmente, o conjunto síncrono antroponímico advindo da autonomeação (nomes secundários) está, contemporaneamente, delimitado a partir da perspectiva do Direito Moderno ocidental em dois grandes grupos: as autonomeações não oficiais, como heterônimos (antropônimo ficcional referente a uma autoria ficcional constituída de personalidade), e aquelas de ordem oficial17 (protegidas por código, legislação, decreto etc.) como os pseudônimos – registrados pelo Instituo Nacional da Propriedade Industrial (INPI) – e os nomes de urna, registrados pela Justiça Eleitoral (Camargo, 2022, p. 203).
Pretende-se, neste recorte da Antiguidade, focalizar a descrição da comunicação ilocutória do nome secundário advindo da autonomeação que, socialmente, voltava-se à intenção do desejo de uma ação e a possibilidade de sua concretização (Vernus, 1996, p. 575; Araújo, 2000, p. 43) a partir de um enunciado antroponímico e de seus devidos ritos predecessores. As morfologias metonímicas18 (parte/todo) de ambas as implicaturas: EN (alta sacerdotisa) + HEDU (adorno/ornamento) + ANA (do/pelo deus Nana/da lua/do céu); AKHEN+ATON (O espírito efetivo de Aton)19conceptualizam pessoas pelo domínio religioso e comunicam pela perspectiva lexicológica e semântica um vínculo do indivíduo com um coletivo religioso que, socialmente, se dá em prol da manutenção do poder político. Trata-se, pois, de um registro antroponímico que reflete a teoria dos vínculos de Durkheim (1999, p. 37-40) – o vínculo solidário por afinidade, especialmente de ordem religiosa, comum às sociedades teocráticas.
A partir da cosmovisão em que se inserem os indivíduos renomeados, é possível compreender, de acordo com a próxima seção, que, na autonomeação “Enheduana”, a filha acádica de Sargão I (2334–2279 a.C.)20 assume uma identidade religiosa de sacerdócio ao deus Nana e, especialmente, à deusa Suméria do amor e da fertilidade Inana (filha de Nana), por necessidade da manutenção do governo do pai que, por volta de 2334 a.C., unira os reinos da Acádia e da Suméria. A autonomeação do faraó egípcio Akhenaton: o espírito efetivo de Aton21 (1353-1335 a.C.; Simpson, 1972, p. 289) – anteriormente Amenhotep IV: que o Deus Amon esteja satisfeito/Amon está satisfeito/ a satisfação de Amon (Fronza, 2013, p. 107) –, por sua vez, fora necessária à diminuição do poder dos sacerdotes que serviam Amon (deus sol) e ao enaltecimento de um deus “[...] criador de tudo e de todos” (Fonsêca, 2020, p. 6), o deus Aton, representado na iconografia por um disco solar.22 A sumarização de tal entidade estaria, por sua vez, no próprio monarca: Akhenaton, considerado um rei-divino (Chapot, 2007, p. 19; 2015, p. 4; Gohary, 1992, p. 224-5; Freed, Markowitz, D’Auria, 1999, p. 84; Rocchi, 2003, p. 32-3).
A autonomeação ilocutória de Enheduana e Akhenaton e sua comunicação política
Considera-se, pois, neste estudo descritivo do fenômeno autonominativo diacrônico, que a autonomeação ilocutória materializa-se, em sentido amplo, enquanto signo antroponímico dotado da comunicação de força de uma ação – que pode ou não se concretizar. Para Vernus (1996, p. 557, nota 2):
Performatif a deux acceptions: (a) Au sens propre, « performatif » (mieux: ‘performatif : explicite’) s‘applique à certains énoncés particuliers qui ont, en raison de leur structure grammaticale et lexicale, mais aussi en raison du contexte, la proprité de réaliser une faction par le seul fait de l’énoncé [...]. Au sens large, « performatif » désigne la force « illocutoire » des énoncés le fait qu’ils peuvent conduire à I’accomplissement d’action.23
Assim, o que se nomeia “enunciado antroponímico ilocutório” não se comporta pragmaticamente enquanto sinônimo específico da Teoria dos Atos de Fala ilocutórios/ilocucionários propostos por Austin (1962, p. 99). Considera-se, porém, tal qual Vernus (1996), que há a possibilidade de julgar um enunciado como performático ou de força ilocutória de maneira ampla, sem que haja na estrutura do enunciado delimitações obrigatórias quanto ao léxico, tais quais verbos específicos “jurar”, “prometer”, “declarar” etc. Por outro lado, esta análise dos nomes ilocutórios Enheduana e Akhenaton não desconsidera as condições ritualísticas e declarativas necessárias à legitimação social da autonomeação das referências, seja da sacerdotisa, seja do faraó. Nesse sentido, consideramos que, tanto na sociedade antiga mesopotâmica quanto na egípcia, havia ritos para indicar, declarar ou oficializar renomeações as quais antecediam rebatismos de figuras politicamente relevantes, daqueles que ingressavam na esfera política, militar e religiosa ou que se casavam (Dirbas, 2017, p. 29, 33).
Tais atos ilocutórios – desde o rito do batismo até a forma antroponímica propagada por meio de cartuchos, pergaminhos, discos em alabastro, blocos em calcário (talatats de Amenhotep IV), hieróglifos etc. – inserem, nos casos de Enheduana e Akhenaton, simbolicamente, a partir dos novos antropônimos – ou seja, através da língua – a possibilidade criadora de novas identidades e comportamentos (Lacan, 1998)24 que, consequentemente, podem (ou não) gerar a viabilidade de mudanças sociais. Essa simbiose entre língua e ação fazia-se comum às sociedades mencionadas, conhecidas pela perspectiva teológica performativa documentada nos respectivos mitos da criação suméria e egípcia bem como em hinos, literatura, entre outros gêneros textuais nos quais partilhava-se a crença do poder criador e mágico da palavra (Biderman, 1998).25
O signo antroponímico secundário Enheduana fora percebido pelos estudos arqueológicos em uma expedição da Pensilvânia, no ano de 1927. Especialmente, a partir da liderança do britânico Charles Leonard Woolley e sua equipe de escavação é que o nome e imagem de Enheduana – cravados em um disco de alabastro – foram redescobertos pela humanidade diretamente dos escombros do Templo da então Ur (Tetlow, 2004, p. 247; Stol, 2016, p. 559). Na mesma região do Iraque contemporâneo, onde se realizou a expedição, foram encontradas diversas escrituras da sacerdotisa que, ao assinar seus textos, parece ter inaugurado o conceito de autoria literária (Lentz, 2020, p. 13).26
É preciso considerar, inicialmente, que o nome sumério secundário assumido pela filha acádica de Sargão I fora uma renomeação dada pelo pai com fins políticos e que, posteriormente, no início do governo, vem a ser assumida pela filha.27 Tal autonomeação advinha de uma necessidade do acádio Sargão de manter-se no poder na região suméria após usurpar o trono de UR-Zababa. Para Dupla (2019, p. 65):
[...] a sacerdotisa-en de Nanna teria sido um cargo de posição política, religiosa e econômica crucial para o sul da Mesopotâmia e para Ur. Essa entronização da sacerdotisa-en, segundo Gadotti28 seria uma estratégia de domínio, visto que Sargão era o usurpador do trono do rei de Kish, ao qual serviu como oficial, derrotando posteriormente as cidades ao norte do país e seguindo em direção ao sul, onde venceu o rei de Uruk, Lugalzagesi e as cidades adjacentes. Assim, por ser um usurpador de terras estrangeiras, Sargão teve que tomar uma série de medidas para legitimar seu governo, uma delas foi instalar sua filha como sacerdotisa-en de Nanna em Ur, um dos templos mais importantes ao sul da Mesopotâmia.
Não há, a partir da literatura vigente, detalhamentos acerca de como teria se dado o discurso do rito de entronização e batismo de Enheduana enquanto alta sacerdotisa de Nana (Dupla, 2019, p. 65), o que permitiria retomar não só o enunciado antroponímico ilocutário, mas o próprio contexto de assunção da identidade e ofício daquela considerada a primeira escritora da história (Lentz, 2020, p. 13). Sabe-se, porém, a partir das considerações de Ottermann (2007, p. 44) que esta medida foi copiada: “[...] o cargo de sumo sacerdotisa de Ur estava sempre com as filhas dos soberanos do respectivo império (mas no caso dos dois filhos de Sargão permaneceu com Enheduana)”.
Assim, a cada soberano, repetia-se o rito e o (re)batismo de sumo sacerdotisas, sendo que a forma antroponímica advinda das consecutivas autonomeações, necessariamente, atualizaria a partícula antroponímica En enquanto identificação de um papel social da elite: sumo/alta sacerdotisa. De acordo com Ottermann (2007, p. 88), porém, é “Com Enheduana [que] aparece pela primeira vez comprovadamente a palavra en para o cargo de sumo sacerdotisas”.29 É possível considerar, portanto, que a autonomeação de Enheduana gera uma nova moda antroponímica de renomeação por sacerdócio da região de Ur. Ademais, o que Ottermann (2007, p. 38-9) percebe como uma palavra identificadora de um cargo: EN, presente, de fato, em listas de ofício religioso da Antiga Mesopotâmia, torna-se apenas um dos elementos lexicais (parte) do novo nome (todo) passível de inferência: a comunicação do cargo religioso e todas as propriedades (feixe de traços) então envolvidas no conceito EN:
A ideologia das elites [...] mostra de maneira especialmente clara a interseção entre a religião e a política. Na falta de textos com autoapresentações é preciso recorrer à iconografia. Nela, o EN é a figura central em quase todas as cenas preservadas: é ele que se relaciona diretamente com a deusa da cidade, ele é o “bom pastor” de seu povo, o herói que mata leões e submete inimigos [...] o en, o sumo sacerdote da divindade da cidade, fosse também sua autoridade política máxima, enquanto o lugal [rei] seria tão-somente uma espécie de chefe militar cuja autoridade se tornava efetiva só em fases de necessidades (= conflitos) militares. (Ottermann, 2007, p. 39)
A partir do exposto, faz-se clara a possibilidade de comunicação de hierarquização dos cargos mesopotâmicos por meio do antropônimo enquanto expressão de vínculo social (Durkheim, 1999, p. 37-40),30ou seja, em Enheduana, há, no nome próprio, marca lexical de pertencimento. No caso em questão, há a demonstração da preponderância política e religiosa do cargo EN, elemento lexical que traz à autonomeação de Enheduana a comunicação de afinidade/pertencimento a um coletivo social: o sacerdócio, comunicando, ainda, a relevância de sua figura para a sociedade de Ur a partir de um conjunto variado de frames:31+figura central, +heroína, +autoridade política etc. Tal referência passa a mediar o poderio de Sargão e, no culto da divindade Inana, demonstra o poder da proteção que a família teria a partir do favorecimento da deusa. Fazem-se presentes na morfologia antroponímica, ainda, outras duas informações (partes) de ordem semântica relevantes à compreensão do todo comunicativo advindo do enunciado antroponímico: uma de ordem enaltecedora: HEDU – adorno; outra de ordem de pertencimento religioso: -AN[A].
Especialmente o significado de “adorno” para os mesopotâmicos excedia a percepção de um “enfeite” ou um acessório, sendo suas materializações físicas: turbantes, joias, ou vestimentas, expressão do que fosse nobre ou até mesmo divino. Inana, por exemplo, apresentava nove adornos – que podem ser considerados espécies do conceito sumério de “MEs” – antes de sua ida ao inframundo.32 “ME” eram “forças e dons divinos” (Cohn, 1996, p. 56), ou seja, propriedades virtuais ou físicas que expressavam poder e dignidade divina. O cargo religioso “EN”, por exemplo, pode ser considerado um adorno “ME” cedido a seres humanos (Ottermann, 2007, p. 252-4),33 assim, o conceito HEDU – adorno – apresenta traços semânticos ancorados em uma realidade social, política e religiosa que permitem a interpretação de Enheduana enquanto espécie de “materialização”, “representação” da divindade Inana.
Desde já, em meados dos processos descritivos da conceptualização do antropônimo Enheduana, compreendemos a afirmação de Bréal (1992), quanto ao fato de serem os nomes próprios os mais significativos de todos: nomes de nomes.34 A percepção da lógica sociocognitiva metonímica e teofórica35 majoritária dos antropônimos comuns às civilizações antigas especialmente suméria e egípcia (Stol, 1991, p. 198-211; Duridanov, 1995, p. 843; Dirbas, 2017, p. 20, 29, 32, 33) demonstra uma tendência significativa: a indicação social do nomeado pelo ofício; uma individuação por meio de algum elemento singular: físico, de ordem do nascimento etc.; e um componente semântico coletivo associado à proteção de um deus ou à denotação expressiva de culto à divindade.
Para que se compreenda a comunicação de pertencimento e culto coletivo a AN em EN-HEDU-ANA bem como sua possível relação com Inana e a manutenção do poder de Sargão I, é preciso compreender, essencialmente, a tríade AN, NANA e INANA envolvida na proposta de culto da então sumo sacerdotisa:
Originalmente, o deus mais graduado era a divindade tutelar da cidade de Uruk, chamado An em sumério e Anu ou Anum em acádio, língua dos semitas. Seu nome era a palavra suméria que designava o céu, e de fato, ele era um deus celeste [...] An era o pai de todas as coisas. (Cohn, 1996, p. 53)
O deus AN teria repartido o céu e a terra com En-lil, tendo este ficado com a terra e AN com o céu. Junto a ele são de semelhante relevância celestial no panteão sumério NANA: deus da lua e INANA, sua filha, rainha dos céus deusa do amor e da guerra. De acordo com Schüssler (2010, p. 12),
Enheduana como primeira alta sacerdotisa da Suméria cultua a deusa Inana e também o deus Nanna ou Sin que é um deus lunar. Nanna está diretamente associado à lua, que para os sumérios recebia mais importância que o sol, ao contrário do Egito.36 [cfr. deus Nanna]
Além de a terminação de pertencimento -ANA em ENHEDUANA associar-se à AN ou NANA, dada a menção ao celeste em “ornamento do céu/do paraíso”, há a possibilidade de que tal signo exerça uma menção à deusa Inana, uma vez que tal deidade era conhecida como a rainha do ceú/ rainha do paraíso (Kriwaczek, 2010, p. 120; Meador, 2000, p. 112). Estudos acerca da teologia suméria (Cohn, 1996, p. 63; Ottermann, 2006, p. 4; Meador, 2000, p. 182) apontam que a deusa suméria Inana apresenta outra nomeação para os assírios e babilônicos: Istar. Especialmente, para Ottermann (2006, p. 4),
[Sargão] criou o primeiro grande império sumero-acádico, no qual se difundiu sucessivamente a língua acádica ao lado da língua suméria. Sargão I adotou como sua deusa pessoal Ištar (nome acádico/semítico), em grande medida idêntica com Inana (nome sumério), e atribuía a ela seus sucessos políticos, seja nas conquistas militares, seja na consolidação do seu imenso império. Sua filha Enheduana [...] dedicou as obras mais importantes de sua produção teológico-literária conhecida (escrita em sumério) à deusa Inana: sendo ela a deusa principal das terras conquistadas por Sargão I [...] mostrar o imperador como seu devoto e protegido era um fator importante na consolidação de seu poder. Esta estreita ligação entre Inana-Ištar e os sucessos militares na construção de um império se tornou uma característica importante desta deusa e explica, em certa parte, seu caráter extremamente bélico e sua posição central na religiosidade assiro-babilônica.
Ao adotar Inana/Istar como deusa pessoal,37 Sargão I reafirma a lenda38 de seu nascimento e de um vínculo anterior com a deusa advindo de um possível sonho que teria tido acerca de um favor divino de Inana em prol da morte de Ur-Zababa, narrativa que lhe amenizava, publicamente, a ação de usurpação do trono:
[...] Sargão terá recaído o olhar favorável da deusa Inanna, o que lhe terá permitido alcançar um alto posto oficial como «copeiro» (MUŠ.KA.UL), na corte do rei de Kiš, Ur-Zababa. [...] revela-nos a história que Sargão terá tido um sonho com carácter profético, segundo o qual a deusa Inanna causava a morte a Ur-Zababa [...] afogando-o num «rio de sangue». O significado do sonho era óbvio: o favor divino estaria prestes a ser retirado ao rei de Kiš e o dom da realeza concedido ao próprio Sargão. (Monte, 2018, p. 92-3)
O enaltecimento da deusa Inana pela filha Enheduana – da expressão do nome secundário ao cotidiano do ofício de sacerdotisa – passa, portanto, a ser um mecanismo de poder e temor ao reinado de Sargão, que teria sido eleito ao poder pela deusa Inana. É singularmente em uma das produções teológico-literárias de Enheduana, “Hino à deusa Inana” (Sjöberg, Bergman, 1969, p. 111; Meador, 2000, p. 37; Eletronic Text Corpus of Sumerian Literature, ETCSLtranslation t.4.07.3, s.p), que a sacerdotisa trata da relação entre An e Inana, buscando “[...] elevar a patrona do império de seu pai ao lugar de rainha dos deuses” (Nogueira, 2015, p. 25):
Inanna é “a senhora magnífica que reúne os poderes divinos do céu e da terra e rivaliza com o grande An, é a mais poderosa entre os grandes deuses […] os deuses Anuna rastejam diante da sua palavra augusta cujo rumo ela não deixa An conhecer; ele não se atreve a proceder contra a sua ordem”. “Perante o seu grito, os deuses da Terra assustam-se. O seu rugido faz os deuses Anuna tremerem como um junco solitário. Quando ela ribomba, eles escondem-se todos juntos. Sem Inanna o grande An não toma decisões e Enlil não determina destinos”. Inanna “semeia a confusão e o caos contra os que lhe desobedecem […] acelera a carnificina […] o conflito e a batalha”.39
A autonomeação de Enheduana – passível de interpretação enquanto “alta sacerdotisa adornada por An/ornamento do céu/do paraíso (de Inana)” (Kriwaczek, 2018, p. 84, 161) – é apresentada, neste estudo, enquanto um enunciado de força ilocutória, uma vez que comunica a intenção de uma ampla ação: a manutenção da cosmovisão suméria a partir do domínio acádio de Sargão I, auxiliando na união dos povos do norte (acádios) e do sul (sumérios) por meio da proteção a uma deusa cujo conhecimento partilhava-se em ambas as culturas: Istar/Inana – e assim seguiria ao longo do território da união sargônica:, a futura Antiga Babilônia. De maneira ainda mais específica, o nome secundário Enheduana – preservado por milênios a partir da identificação de autoria em textos religiosos – implica uma identidade suméria, ou seja, uma nova identidade à filha de Sargão. Essa renomeação precede as ações religiosas de manutenção do culto à Inana – deusa pessoal do pai, favorecendo, consequentemente, a manutenção do poder de Sargão I, uma vez que o signo antroponímico performático comunica ao sul da Mesopotâmia – onde se fazia comum a adoração à Inana – a continuação do culto a deusa protetora da empreitada militar de Sargão I e adorada através de Enheduana no Templo de Nana.
A relevância política da princesa de Akkad é atestada historicamente, sendo a sacerdotisa considerada mediadora de Sargão I em Ur (sul da Mesopotâmia) (Meador, 2000, p. 8, 46, 52; Ottermann, 2007, p. 122). Ademais, de acordo com Lentz (2020, p. 13), “[...] devido à posição privilegiada que ocupava na esfera mítico-religiosa, talvez tenha feito uso de suas composições nos rituais que realizava, o que explica [...] séculos depois [...] ser venerada”. Enheduana, embora consagrada ao templo de Nana, passa, portanto, a ser vista pela sociedade suméria como a sumarização da deusa Inana (Kriwaczek, 2018, p. 182). Esse fenômeno simbiótico entre indivíduo e comunicação antroponímica de pertencimento a uma coletividade teofórica se repetirá a partir da autonomeação de Amenhotep IV, julgado, a partir de sua autonomeação – Akhenaton – como o único e verdadeiro conhecedor do deus Aton.
A relação de Amenhotep IV (Décima oitava dinastia do Reino Novo do Egito Antigo) à construção cosmológica egípcia de Aton é anterior à sua coroação egípcia no Festival-Sed, momento de afirmação do faraó e de cerimônias de oferendas aos deuses (Gohary, 1992, p. 3), tendo tido início com seu pai: Amenhotep III, que “[...] enraizou alguns dos preceitos teológicos sugeridos por Akhenaton, especialmente aqueles associados ao deus solar, Aton” (Chapot, 2015, p. 3). Porém, é no primeiro Festival-Sed do faraó que viria a se autonomear Akhenathon – filho de Amenhotep III – que se iniciam as primeiras demonstrações de exigências quanto à adoração a um deus único. Ainda assim, o monarca apresenta-se no festival com o nome comum dos faraós da sua dinastia – Amenhotep IV:
Ao subir ao trono, Akhenaton não abandona seu nome tebano, permanecendo com o nome Amenhotep (Amon está satisfeito), seguindo uma tradição de reis predecessores (Amenhotep I –1525-1504 a.C, Amenhotep II –1427-1491 a. C, e Amenhotep III –1391-1353 a.C). Isso mostra que a primeira intenção do faraó não era romper com a religião tebana de imediato (Fonsêca, 2020, p. 6).
Mesmo que, inicialmente, tivesse mantido seu antropônimo primário, há reformas iconográficas durante o festival que indicariam sua futura nomeação secundária, o que permite retomar o fato de que o rebatismo ilocutário em sociedades antigas antecedia um rito:
[...] todos os outros deuses são suprimidos, é excluída a palavra deuses no plural, dando ênfase somente ao deus Aton. Nas representações do festival-sed, Akhenaton buscou evidenciar sua imagem, representada de forma mais visível e clara que o deus Aton, retratado por meio do disco solar e os raios de sol. O festival-sed, nesta conjuntura, é importante para concretizar a proposta ideológica do faraó, que precisava de um ritual para prenunciar a mudança de Amenhotep para Akhenaton, além de destacar a figura de Aton em detrimento do deus Amon-Ra. (Fonsêca, 2020, p. 8)
A mudança efetiva de nome de Amenhotep IV para Akhenaton teria se dado no sexto ano de seu reinado (Baines, 1998, p. 272). Historicamente, os faraós comuns à Décima Oitava Dinastia (Dinastia do Novo Reino 1549/1550 a 1292 a.C.) adotavam nomes teofóricos, cuja comunicação metonímica de pertencimento representava a adoração e proteção do deus Amon (deus do ar/vento), ilustrado pela imagem de Amon-Ra. De acordo com Chapot (2015, p. 14),
A primeira menção ao deus foi feita nos Textos das Pirâmides, e sua relação com a cidade de Tebas é documentada desde a décima primeira dinastia, quando quatro governantes do período adotaram o nome de Amon em sua denominação pessoal “Amonemhat”, “Amon é preeminente”, postura semelhante à dos faraós da Décima Oitava Dinastia, os quais optaram por louvar a divindade tebana em seu nome de nascimento “Amon está satisfeito” como Amenhotep I, Amenhotep II, Amenhotep III e o próprio Akhenaton, que subiu ao trono como Amenhotep IV e efetuou a mudança que o tornou “útil ao disco solar”, sacramentando um corte com a tradição tebana ainda no começo do reinado.
Do exposto, depreende-se que a autonomeação de Akhenaton propunha uma comunicação de mudança política que visava à diminuição do poder dos sacerdotes e o enaltecimento do faraó enquanto mediador entre os homens e a divindade:
[...] a eliminação do deus durante o reinado de Akhenaton, substituído em muitos contextos pelo próprio faraó, seria a solução radical encontrada para restaurar o papel tradicional de mediador entre deuses e homens, que cabia exclusivamente aos faraós, diminuindo assim a comunicação direta das pessoas com as divindades que escolhessem, enfraquecendo sobremaneira a supracitada piedade pessoal. (Chapot, 2015, p. 21)40
A reforma religiosa conhecida como Reforma Amarna tinha por objetivo apagar referências a Amon e instaurar uma nova deidade sumarizada no faraó:
[...] em pouco tempo (menos de duas décadas), tradicionais elementos da antiga religião egípcia foram omitidos ou negados em nome de uma nova ordem estabelecida por Aton. Akhenaton oferecia aos seus súditos a crença na adoração ao disco solar, fonte única da vida, criador de toda humanidade, que recusava o caos (ideologicamente necessário para monarquia), a escuridão, a morte, assim como todo rico panteão politeísta. Paralelamente, notaremos a exacerbação da tendência anteriormente comentada no Reino Novo, na qual os monarcas tentavam superexaltar sua natureza divina a partir da divinização e culto ainda em vida. No caso de Akhenaton, a ênfase na figura real foi tamanha que ele próprio se tornou um deus, ao menos a versão terrena da divindade, um co-regente passível de receber veneração de seus súditos. (Chapot, 2007, p. 92)
Para Lamb (2008, p. 21), a própria autonomeação de Akhen-aton age na cosmologia egípcia enquanto construção de uma deidade:
A escolha do nome “Akhenaton” parece não ter sido apenas pelo significado geral da palavra; a primeira sílaba do nome, Ank, já tem um espaço privilegiado dentro da língua e do pensamento egípcio, passa a ideia de realização do ser na luz, o iniciado que venceu as terríveis provas do mundo dos mortos e transformou-se num ser de luz, cujo esplendor será benéfico para quem lhe seguir o caminho.
É relevante mencionar, ainda, que, além da mudança de nome como comunicação da intenção de uma reforma religiosa, logo, uma autonomeação de força ilocutória, a própria capital do Egito – então Tebas41 – foi também modificada em signo toponímico (nome de lugares) e espaço geográfico:
Akhenaton transferiu a capital do Egito para um território até então desabitado, fundando uma nova cidade: Akhetaton (a atual Amarna), cujo significado é “Horizonte de Aton”, para onde mudou-se com sua corte. A nova capital [...] levou este nome devido à impressão fornecida por sua paisagem natural: quando o sol nasce entre os penhascos do relevo, forma-se naturalmente a figura do hieróglifo “akhet” (horizonte) (Fronza, 2013, p. 108).
Foi exatamente nesta região – atual Amarna – que, William Matthew Flinders Petrie, ao conduzir escavações entre os anos 1889 e 1892, encontrou diversas cartas do cotidiano do reinado de Akhenaton. Posteriormente, houve, ainda, a descoberta de “[...] artefatos valiosos, como o belo busto da rainha Nefertiti, mulher de Akhenaton, encontrado pela expedição de 1911 – 1914, coordenada por Ludwig Borchardt” (Kaefer, 2018, p. 134). Mas, de fato, o que mais possibilita os estudiosos ainda hoje conhecerem o comportamento de Akhenaton e o modo como era visto são os talatats,42 blocos de quase 3 palmos encontrados no ano de 1926, sob os cuidados do arqueólogo Henri Chevrier, durante a reforma do complexo de Karnak, principal local de culto egípcio. Dentre os blocos de pedra, havia, porém, figuras bastante deformadas de Akhenaton, o que, para o arqueólogo O’Connor et al. (2007, p. 84), não foi uma consequência do intemperismo; seria, por sua vez, uma depredação intencional. Após a morte de Akhenaton, “a tradicional sucessão dinástica foi restaurada no país”.
Da tentativa de apagamento do nome de Akhenaton na sociedade egípcia, ilustra-se o fato de que, para os egípcios, assim como para os mesopotâmicos, apagar o nome de uma pessoa era o mesmo que apagá-la da História, e quem o fizesse estaria sob o jugo de infindas maldições. Essa crença no signo antroponímico faz-se perceptível, ainda, na literatura preservada durante a segunda tentativa de unificação – pós-Sargônica – das regiões sul e norte da mesopotâmia com Hamurabi (cerca de 1810-1750 AEC). Em seu código, o rei afirma:
[...] Se esse homem [...] apagar o meu nome escrito e escrever o seu nome (ou) por causa destas maldições mandar um outro (fazer), esse homem, seja ele senhor, seja ele governador ou qualquer pessoa chamada com um nome, que o grande Anum, o pai dos deuses, aquele que pronunciou o meu governo, tire-lhe o brilho da realeza, quebre o seu cetro, amaldiçoe o seu destino. (Buzzi; Boff, [1976] 1980, p. 11)
Assim, em ambas as sociedades antigas “Mesopotâmia” e “Egito”, a singularidade dos nomes próprios, fosse de pessoa, fosse de lugares, não se fazia expressa somente na estilística diferenciada e cuidadosa com relação aos demais signos linguísticos (Durand, 1998, p. 31), mas exercia um registro singular: a função histórica de uma possível extensão simbólica de uma pessoa (referência) a partir da História. A partir dessa lógica, depredar o registro de um nome era o mesmo que destruir uma pessoa. Além de o signo antroponímico exercer a possibilidade de continuidade biográfica de um ente – ou pela ótica diacrônica, a onisciência de um legado –, a visita aqui proposta à autonomeação antiga demonstrou, por meio da análise dos nomes secundários Enheduana e Akhenaton, que tais antropônimos com valor ilocutário exerceram a comunicação às respectivas sociedades da intenção de ações sociopolíticas. Conforme se demonstrou quanto às articulações sociocognitivas (semânticas, metonímicas e culturais) presentes nos signos antroponímicos de Enheduana e Akhenaton, as autonomeações em questão propuseram a singularização de um ente em relação a um coletivo, seguindo a lógica majoritária de um coletivo de ordem teofórica, sendo este último associado, ainda, à gestão política, visto ser comum à cosmologia mesopotâmica e egípcia as esferas religiosas e políticas mesclarem-se.
É factível, por fim, a partir de uma perspectiva dialética, relacionar brevemente a parte contextual analisada – casos expressivos da autonomeação antiga – ao todo antroponímico ocidental (seja de nomeação primária ou secundária43). Embora haja diferenciações quanto à conceptualização dos antropônimos, faz-se perceptível que a lógica sociocognitiva majoritária de nomeação de pessoas não se perdeu na organização morfológica do ortônimo (nome civil), uma vez que a junção entre prenome (parte) e sobrenome (todo) insere à sociedade moderna – simbólica e, obrigatoriamente – um indivíduo (prenome) expresso sempre em relação com Outro (Lacan, 2003, p. 87), no caso, a um coletivo familiar (sobrenome).
Epílogos provocativos
A semântica metonímica dos nomes próprios de pessoa – sejam eles primários ou secundários – chama a atenção para as interferências necessárias do outro (ou do todo) – o signo alter/coletivo – na formação da identidade. Nascida do traço unário enquanto instância psíquica do Eu sempre relativa ao Outro, tal conceito – a identidade – seria percebido socialmente, de maneira inicial, a partir da inserção simbólica do indivíduo em sociedade, que, linguisticamente, tem sua origem a partir de seu nome próprio. Tal signo, na idade considerada moderna, apresenta-se, judicialmente, como direito básico à personalidade e prossegue a expressão de um coletivo a partir do sobrenome. Seria, pois, a partir do batismo, do ritual ilocutário de nomeação, que o indivíduo desenvolveria significantes: elementos marcadores da determinação simbólica de si, o que em Antroponomástica pode ser percebido enquanto um feixe de significados associativos do nome, aquele devidamente relacionado ao componente enciclopédico do conceito de um nome próprio. Assim, a biografia de uma pessoa terá relativa influência para que seu nome primário seja menos ou mais compartilhado entre as diversas convenções sociais e seu respectivo significado não é absolutamente lexical ou etimológico. Os signos Enheduana e Akenathon não estão definidos em paráfrases lexicológicas, sinônimos ou campos lexicais, mas, ainda assim, conforme se demonstrou neste estudo, a descrição da conceptualização desses antropônimos pela aferição sociocognitiva (linguística, social, histórica e cultural) é passível de enunciação e, especialmente, a apresentação dos signos como autonomeações, ou seja, reelaborações simbólicas de si, revelam o quão significativa e recursiva é a relação entre signo antroponímico, identidade e política.
É possível depreender primeiramente quanto à autonomeação da sacerdotisa mesopotâmica “Enheduana” que sua nova identidade suméria (sendo a primária acádia desconhecida) intenciona comunicar a sua afinidade e a do pai – Sargão I – ao povo sumério, aceno político que dialoga com o desejo de manutenção do poder do imperador. São diversas as evidências de que a autonomeação da adoradora de Inana é uma comunicação ilocutória: dentre elas, estão a escolha da língua suméria em detrimento do acádio – sua língua natural –, a expressão do cargo En (sumo-sacerdotisa), que lhe dá poder decisório político, e a comunicação teológica de vínculo religioso com a deusa suméria Inana, considerada a protetora de seu pai Sargão I.
No caso do faraó Akhenaton, a ideia de reelaboração de si a partir do Outro/coletivo (religião) é ainda mais explícita no signo secundário advindo da autonomeação por ser de conhecimento da historiografia seu nome primário: Amenhotep IV, signo antroponímico que faz menção ao deus Amon. Trata-se, pois, da comunicação de mudança de si com fins de mudança religiosa ampla. Aliando o signo antroponímico às crônicas históricas, é possível considerar que a renomeação antecedia um descontentamento com o sacerdócio de Tebas a Amon e implicava uma reforma religiosa de magnitude centenária ao Egito. A partir dos resultados dessa visita exploratória à autonomeação antiga de força ilocutória, demonstramos que o paradigma de estudos antroponímicos tradicionais, quando pautados exclusivamente pela etimologia ou sociolinguística laboviana,44não é suficiente para pormenorizar as esferas sociocognitivas e funções políticas da autonomeação antiga.
Assim, a partir deste olhar exploratório, abrem-se espaços para novas considerações que investiguem a face ilocutória e política do signo antroponímico, ampliando-a seja em contextos antigos ou clássicos, seja em contextos políticos modernos.
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Notas